sexta-feira, 9 de maio de 2008

Robert Paxton - A anatomia do fascismo - Cap. 7

PAXTON, Robert. A anatomia do fascismo. São Paulo: Paz e terra, 2007. Capítulo 7.


No capítulo sete de seu livro sobre o fascismo, Robert Paxton vai se preocupar em descrever alguns regimes ou sistemas políticos dentro e fora da Europa que tenham algumas características fascistas mas que, segundo a teoria de Paxton, não podem ser considerados fascistas de fato ou de direito. Para Paxton, fascistas foram os regimes de Hitler e Mussolini, alguns regimes concomitantes a esses ou mesmo posteriores foram somente inspirados ou sofreram influência desses fascismos clássicos. Paxton ainda se indaga se o fascismo ainda é possível no mundo de hoje, o que ele vai responder no final do capítulo.
Alguns estudiosos importantes afirmaram que o período fascista terminou em 1945. O maior obstáculo ao renascimento do fascismo clássico, após 1945, foi a repugnância que ele veio a inspirar, além de enfrentar a crescente prosperidade e a globalização aparentemente irreversível da economia mundial e o triunfo do consumismo individual, coisas diametralmente opostas ao fascismo. Porém, o fim desse regime foi posto em dúvida na década de 1990 por uma série de acontecimentos preocupantes: a limpeza étnica nos Bálcãs; a exacerbação dos nacionalismos excludentes no Leste europeu pós-comunista; a disseminação da violência dos skinheads contra os imigrantes, na Grã-Bretanha, na Alemanha, na Escandinávia e na Itália; a primeira participação de um partido neofascista num governo europeu, na Itália; a surpreendente chegada em segundo lugar nas eleições de 2002, na França, de Jean-Marie Le Pen, declaradamente de extrema-direita.
Atualmente, a posição mais comum é que, embora o fascismo ainda esteja vivo, as condições da Europa do entreguerras, que permitiram a ela fundar grandes movimentos e até mesmo tomar o poder, deixaram de existir, e Paxton concorda e vai defender esta tese. Porém, se entendermos o renascimento de um fascismo atualizado como o surgimento de algum tipo de equivalente funcional, e não de uma repetição exata, essa recorrência é de fato possível.
Paxton ainda vai traçar um extenso panorama da Europa Ocidental pós-guerra, buscando alguns resquícios do fascismo ainda existentes e como eles estão se manifestando até os dias de hoje.
Ex-nazistas e ex-fascistas impenitentes, durante toda a geração que se seguiu à Segunda Guerra Mundial, criaram movimentos herdeiros em todos os países europeus. A Alemanha, como é natural, foi a que despertou as maiores preocupações. Usando as palavras de Francisco Carlos, “a desnazificação na Alemanha nazista não foi completa”. Paxton vai querer demonstrar que, tanto na Alemanha quanto na Itália, alguns pequenos partidos fascistas ainda continuaram com força, principalmente a partir da década de 1990. Em outros países da Europa Ocidental os movimentos neofascistas são ainda mais fortes, como na França, na Áustria e na Espanha.
Para Paxton, o ressurgimento do fascismo se deve a vários fatores. Primeiro, os fascistas europeus não foram totalmente eliminados, ou mortos, até 1945. Muitos ainda sobreviveram. Em segundo lugar, a nova economia européia causa desemprego e divide a população entre mais qualificados em nível escolar e outros menos qualificados. E em terceiro, porém não menos importante, o problema dos imigrantes que foram em massa para a Europa nas décadas de 1960 e 70. Além do mais, a imigração para a Europa havia mudado de figura em relação a tempos anteriores do fascismo. Enquanto os imigrantes de antes vinham da Europa do Sul ou do Leste, diferindo apenas ligeiramente de seus anfitriões, os novos imigrantes vinham agora de seus antigos territórios coloniais: África do Norte e África Subsaariana, Caribe, Índia, Paquistão e Turquia. E enquanto os imigrantes de antes tendiam a ser rapidamente assimilados e a desaparecer na população em geral, os novos aferravam-se a costumes e religiões visivelmente diferentes.
Em suma, ainda que na Europa Ocidental, a partir de 1945, vários movimentos neofascistas tenham surgido, as circunstâncias, hoje em dia, são tão diferentes da Europa do entreguerras que não há abertura significativa para partidos abertamente filiados ao fascismo clássico.
Já no Leste europeu pós-soviético, em nenhum outro lugar do planeta produziu, em anos recentes, uma coleção mais virulenta de movimentos de direita radical. Apenas para citar um grande exemplo, podemos citar os massacres nos Bálcãs, promovidos por Milosevic, no começo da década de 1990. Segundo Paxton, este foi um claro movimento de limpeza étnica promovido na região, o que talvez seja a característica mais cruel e visível do fascismo. Portanto, foi na Iugoslávia pós-comunista que surgiu o equivalente mais próximo das políticas nazistas de extermínio já ocorrido na Europa do pós-guerra.
Fora da Europa, Paxton analisa vários casos que, por muitos estudiosos são considerados fascistas. Para o autor, o que de mais próximo surgiu de um movimento com as características fascistas fora da Europa foi a experiência brasileira. Os integralistas brasileiros foi um movimento muito bem organizado, declaradamente fascista, com muitos elementos característicos deste fenômeno.
Outros casos ainda foram levados em consideração, como os regimes de Pinochet no Chile, Perón na Argentina e o Japão imperial da Segunda Guerra Mundial. No geral todos estes regimes se enquadram na teoria geral da Paxton, que diz que foram movimentos inspirados nos fascismos clássicos, com características próprias e com muitos elementos básicos diferentes dos regimes clássicos.
Paxton vai tirar duas conclusões de seu texto. A primeira é que não existiu nenhum regime literalmente, ou completamente, fascista fora da Alemanha e da Itália, mas que, de fato, inspirou muitos extremistas em todo o mundo. Em segundo, se aceitarmos uma interpretação do fascismo que não se limite à cultura do fim-do-século europeu, a possibilidade de um fascismo não-europeu não é menor que a que existia na década de 1930, e talvez ainda seja maior, devido ao grande aumento do número de experiências fracassadas de implantação da democracia e de governo representativo ocorrido desde 1945. Enfim, o fascismo alemão e italiano não seriam mais possíveis, mas seriam sim, muito bem possíveis, movimentos similares que denominaríamos neofascistas.

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